Em 14.860 ha de área no norte do Estado do Rio de Janeiro, na região da Bacia de Campos, um mosaico de ecossistemas terrestres e aquáticos constitui desde 1998 o único parque nacional protegido na forma de restinga, o PARNA Restinga de Jurubatiba que é delimitado a norte e a sul por dois corpos d’água de grande interesse em termos de conservação e valoração socioambiental (Lagoa Feia e Lagoa Imboassica) (Vértices do Polígono: 1 (-41,866758; -22,414679); 2 (-41,438931; -21,948339); 3 (-41,258435; -21,894774); 4 (-41,179387; -22,118887); 5 (-41,840408; -22,427388). A temperatura média anual na região é de 22,6 oC e a precipitação é de 1164 mm. A distribuição de chuvas é sazonal, sendo o verão a estação com maior índice pluviométrico, 189 mm em janeiro (FIDERJ, 1978). Nos meses mais secos – junho, julho e agosto – o solo apresenta deficiência hídrica e de outubro a janeiro ocorre reposição de água no solo (Henriques et al., 1986). O Parque estende-se por uma faixa de 60 km de comprimento por 10 km de largura (Araújo et al., 1998) (Fig. 1). Os depósitos de areia dos diferentes eventos de glaciação formam cordões arenosos paralelos à costa. Os cordões são entrecortados pelo Canal Campos-Macaé, aberto no século XIX para facilitar o escoamento do açúcar produzido na região, além de duas dezenas de lagoas que em função da origem e aporte hídrico diferem substancialmente entre si quanto à morfometria, propriedades físico-químicas e, consequentemente, composição biótica (Rocha et al., 2004; Petry et al., 2016). Entre os cordões arenosos existem áreas que são permanentemente inundadas por projeções das lagoas e áreas periodicamente inundadas em função da variação do lençol freático e do regime de chuvas. Uma das maiores características destes ecossistemas aquáticos são as altíssimas concentrações de COD apresentados por muitos destes ecossistemas, que refletem diretamente sobre o balanço de C destes com a atmosfera na estruturação das comunidades aquáticas (Farjalla et al., 2009).
Estudos no PARNA Restinga de Jurubatiba registram cerca de 588 espécies de plantas vasculares e a ocorrência de 10 comunidades vegetais (Araújo et al., 1998) associadas a condições ambientais específicas como oligotrofia, grau de dessecamento, temperatura, salinidade e grau de inundação (Scarano et al., 2005). Dentre as comunidades listadas para a área estão a Formação de Mata Permanentemente Inundada, Formação de Mata Periodicamente Inundada, Formação de Mata de Cordão Arenoso, Formação Halófila-Psamófila Reptante, Formação Herbácea Brejosa, Formação Arbustiva Fechada de Pós-praia, Formação Arbustiva Aberta de Clusia, Formação Arbustiva Aberta de Ericacea, Formação Arbustiva Aberta de Palmae e Vegetação Aquática (Araújo et al., 1998). A fauna na área de estudo também é bastante diversificada, incluindo jacarés do papo amarelo, cachorros do mato, tamanduás, além de aves migratórias e uma centena de espécies de peixes marinhos e de água doce (Di Dario et al., 2013; Xavier, 2016).
Acredita-se que a preservação da área se deu pela falta de acesso, pelo mar bravio e turvo e pelo desinteresse governamental em relação aos ecossistemas continentais da Bacia de Campos. Porém, dado a relativamente recente conversão do sistema em UC (1998) e o histórico de ocupação humana das planícies costeiras do Sudeste que antecede à colonização europeia, os ecossistemas da região, incluindo as restingas e lagoas costeiras experimentam há séculos os impactos antrópicos pelo desenvolvimento de atividades agrícolas, queimadas, caça e pesca (Folharini, 2015). Especificamente na área do Sítio RLaC ocorrem três vilarejos habitados por comunidades tradicionais, e atividades agropecuárias são desenvolvidas em propriedades da área do entorno da UC (Folharini, 2015). O PARNA Restinga de Jurubatiba ocupa parte dos municípios de Macaé, Carapebus e Quissamã, sendo que este último detém 65% do território da unidade de conservação.
Por quase duas décadas (1999-atualidade) este ecossistema é alvo e integra um programa de pesquisa da rede internacional ILTER (PELD Sítio RLaC), que nos seus primeiros 10 anos investigou os efeitos de perturbações antrópicas e naturais nos processos ecológicos dos ecossistemas da restinga (Chamada 001/1997) (Rocha et al., 2004a). Um enfoque de mudanças ambientais globais, em escala espacial e temporal amplas (de microcosmos a ecossistemas inteiros; em intervalos de dias a tempo geológico), e uma abordagem unificada e comparativa entre organismos com diferentes níveis de organização e história de vida, são aspectos que passaram a ser contemplados a partir de 2009 (Chamadas 59/2009; 34/2012; presente proposta).
As lagoas do PARNA Restinga de Jurubatiba permanecem isoladas do mar por uma faixa de aproximadamente 30 m de areia e além da percolação, recebem aporte de água marinha apenas em eventos de ressaca e ocasionalmente pelo rompimento da barra arenosa. Em virtude da proximidade e influência marinha, a região da barra de areia dessas lagoas é pobremente estruturada, e plantas aquáticas e gramíneas ocupam tanto os braços laterais, bem como a porção intermediária e do fundo dos ecossistemas. A área dessas lagoas (de 0,02 a 4,11 km2) sofre contração devido ao forte dessecamento no período de Estiagem (abril a setembro) e expansão pelo aumento da pluviosidade no período Chuvoso (outubro a março), quando temperaturas mais elevadas são registradas (Hollanda-Carvalho et al., 2003). Além disso, essas lagoas possuem diferentes concentrações de COD (Farjalla et al., 2009), constituindo excelentes laboratórios naturais para estudos de seu efeito no balanço de carbono com atmosfera e na estrutura das comunidades aquáticas.
Na presente proposta de estudo, além das 18 lagoas costeiras na área do PARNA e duas em suas áreas limítrofes (<10km, Imboassica e Feia), serão monitoradas cinco áreas na restinga de forma a contemplar o gradiente litoral-continente nos ecossistemas terrestres e aquáticos, em um período de amostragem de 48 meses (Fig. 1). Um esforço amostral padronizado, com frequência quinzenal, mensal, trimestral ou semestral (ver seção de Cronograma de Atividades) contempla a replicação do fator sazonalidade pluviométrica, seguindo os critérios estabelecidos por Eberhardt & Thomas (1991) de acordo com as sub-áreas abaixo descritas. Assim, em 2009 foram selecionadas três parcelas permanentes de 6 ha de restinga, caracterizadas por diferentes formações vegetacionais: Formação aberta de Clusia (FACL), Formação aberta de Ericácea (FAER), porções de Mata periodicamente inundada (MPIN) e um fragmento de Mata seca de restinga (FMSR), quatro pontos de amostragem na lagoa Cabiúnas e dois pontos na lagoa Comprida (Fig. 1). Estas vem sendo periodicamente monitoradas. Com a aprovação da presente proposta em seu orçamento global, a área de estudo será ampliada, de forma a contemplar outros sistemas límnicos do PARNA Restinga de Jurubatiba e as duas lagoas localizadas em sua área limítrofe. As amostragens conjuntas da equipe técnica permitirão a produção de dados de maneira a suportar inferências mais amplas sobre o funcionamento dos ecossistemas e o monitoramento da dinâmica biológica nos ambientes terrestres e aquáticos. Assim, com a finalização desta terceira etapa do projeto na temática estabelecida em 2009, pelo menos onze ciclos hidrológicos anuais serão contemplados nas análises. Além do tamanho das lagoas, da distância mínima dessas com o oceano adjacente e da cobertura vegetal, diversas variáveis ambientais serão registradas quando da amostragem da biota, em cada um dos seis e dois pontos amostrais nas lagoas ortogonal e paralelamente orientadas em relação ao mar: profundidade do disco de Secchi, temperatura, pH, oxigênio dissolvido e profundidade máxima. Amostras de água servirão para determinação das concentrações carbono orgânico dissolvido, nutrientes (Ptotal e Ntotal) e coloração da água. No campo será avaliada ainda a pressão parcial de CO2, para estimativa do balanço deste elemento com a atmosfera e serão instaladas câmaras de sedimentação para estimativas de acúmulo de carbono no sedimento.